Era uma vez uma família com 3 filhos. Os pais, executivos de grandes multinacionais, priorizavam os estudos, boas escolas e tudo que pudesse levar a bons empregos e uma vida próspera em bens materiais no futuro. Tinham um tempo escasso com os filhos, mas quando estavam juntos eram amorosos, ajudavam nas tarefas de casa e procuravam ensinar outras línguas. Os primeiros filhos logo começaram a se destacar entre os colegas, com boas notas e alto rendimento escolar. O filho mais novo, adorava ler, mas começou a tirar notas baixas em algumas disciplinas, porém recebia elogios do professor de arte. Os primeiros seguiram as mesmas carreiras dos pais, o mais novo preferiu adiar a faculdade e fazer uma viagem pelo mundo. Ao voltar, escolheu morar em uma comunidade e desenvolver um trabalho social, pelo qual mal conseguia sobreviver sozinho por não ser bem remunerado e precisar contar com "bicos" para garantir alguma renda . Eventualmente contava com a ajuda dos pais e dos irmãos para continuar levando seu estilo de vida bem mais simples que o do restante da família. Os pais ficavam orgulhosos ao contar sobre as conquistas dos filhos mais velhos, contratados para trabalhar cada um em um país diferente, liderando grandes equipes e sendo convidados para palestrar sobre suas áreas de trabalho. Em contrapartida sempre se frustravam com as escolhas do mais novo, como se tivessem falhado em alguma coisa na educação dele.
Esta história é apenas inspirada em fatos reais e mais comum do que parece. Poderíamos pensar: como a mesma educação gerou experiências de vida tão distintas? Não nos cabe um juízo de valor, mas se você está pensando algo como "eu seria como o mais novo, escolhas muito mais interessantes", ou "não entendo esse mais novo, de que adianta fazer trabalho social e não conseguir pagar as próprias contas?" você já está se baseando em SEUS próprios valores e é sobre isso que eu gostaria de escrever. A história é apenas ilustrativa e serve como uma isca para que você depois de a ler, vire a lente para si mesmo.
Cada um de nós nasceu em uma determinada cultura familiar. Somos altamente influenciados pelos hábitos de nossos pais e/ou cuidadores. Desde pensamentos e crenças até a alimentação, a relação com o corpo, a prática de atividade física (ou a não-prática), tudo se apresenta e diz algum respeito a como somos hoje. Da mesma forma passamos a frente toda essa estrutura quando temos filhos ou educamos as novas gerações. Olhar para essa cultura que atravessa gerações é reconhecer o quanto somos únicos, que tesouro estamos entregando e também que miséria estamos perpetuando. Pois podemos perseguir, porém não alcançamos a perfeição. Já dizia o poeta Mario Quintana falando em "Das utopias":
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
É do querer constante deste improvável amadurecimento que, a solavancos, amadurecemos (e regredimos também, em outros momentos) em uma espiral a ser percorrida enquanto houver vida.
Em que cultura nasci? O que minha família valorizava? Em que momento os olhos dos meus pais brilhavam? Diante do que? Como assimilei esses valores à minha vida?
Uma vez em um curso sobre educação, com o psicanalista e professor Luiz Hans, autor do livro "A arte de dar limites", ele disse algo próximo disso: o sujeito é capaz de questionar a si mesmo, e com isso ferir a própria autoestima, mas não questiona os próprios valores".
Nossos conceitos sobre sucesso, sobre felicidade, sobre aquilo que desejamos conquistar porque nos parece mais "certo" é completamente moldado pelos conceitos que aprendemos na infância. E ainda que você pense, "Comigo isso não faz sentido, meus valores são completamente opostos aos de minha família", observe como seguimos aquela diretriz ou, então, estaremos no outro extremo, que é nos opor, mas sempre baseados naquele inicial conceito fixado em nós. Na história inicial podemos perceber os dois primeiros filhos seguindo o mesmo caminho trilhado pelos pais e recebendo amor e atenção por essa via, já o terceiro se opondo àquele mundo que lhe foi apresentado e seguindo o caminho oposto. Para o terceiro filho, muito provavelmente, um período de desencaixe e sofrimento o deve ter abarcado em que sentiu que sua vontade o guiava para um lado enquanto que seus pais esperavam dele algo diferente. Isso não exclui o esforço descabido que pode ter sido vivido pelos mais velhos para corresponderem ao alto padrão das expectativas dos pais.
E você? Qual a sua história? Seguiu o que era esperado? A que custo? Escolheu algo diferente do que era esperado por seus pais? A que preço? Mas se seguindo ou nos opondo os valores da família temos sempre esses valores como referência, que escolhas seriam as nossas sem essa interferência. Quem seríamos sem a influência da educação que tivemos?
Fazendo essas reflexões podemos estar mais aptos a compreender os valores que estamos passando adiante ao educar nossos filhos.
Depois de algumas newsletters bem pessoais eu precisava de um respiro com um pouco de ficção e distanciamento, pois escrever sobre mim é um mergulho forte que nem sempre suporto fazer repetidamente, embora seja esse o convite que eu esteja fazendo a você.
Desta forma me despeço por hoje desejando uma semana reflexiva e de aprendizado para nós.
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Um abraço,
Aline.
Olá!!! Aline, parabéns pela belíssima reflexão desta semana. Gratidão por propor num mundo tão volátil ter uma pausa para um Respiro. Que seja Luz. Abraços fraternos.